Batemos um papo com a Dra. Lívia Porto, endocrinologista do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, sobre a semaglutida, medicação que se popularizou por sua eficácia no tratamento da obesidade.
Inicialmente indicada para o diabetes tipo 2, a semaglutida foi liberada pela Anvisa no começo deste ano para tratamento da obesidade, mas seu uso indiscriminado tem levantado diversas polêmicas. Quais riscos que utilizar o medicamento sem orientação médica pode oferecer?
DRA. LÍVIA PORTO. A semaglutida foi estudada para o tratamento do diabetes tipo 2 e, depois, da obesidade. Então, quando falamos em benefício e risco potenciais, só temos dados e parâmetros de segurança para esses pacientes, e não para pessoas que querem apenas emagrecer. É importante distinguir uma coisa da outra. A obesidade e o diabetes são doenças que requerem tratamento multidisciplinar, e a medicação é orientada considerando histórico e necessidades daquele paciente. Além disso, a posologia é muito importante: o uso de doses inadequadas ou da progressão de doses inadequadas pode levar a efeitos colaterais mais intensos e outros problemas sérios, como desidratação e até sobrecarga de alguns órgãos, por exemplo. Por isso, a recomendação é que a semaglutida não seja utilizada apenas para a perda de peso e sem indicação e acompanhamento médico.
Quais são os benefícios da semaglutida?
Além da eficácia na perda de peso e dos efeitos positivos na saúde, já que estudos demonstraram seu impacto na redução da gordura no fígado, por exemplo, a semaglutida tem um bom índice de segurança. Atualmente, esses fármacos análogos ao GLP-1 [hormônio produzido pelo nosso organismo], como a semaglutida e a liraglutida, não têm ação nos nossos neurotransmissores, então não causam alterações comportamentais – como aumento de sono ou insônia, agressividade, ansiedade, irritabilidade etc. – e nem concorrem com remédios psiquiátricos, por exemplo.
Há um limite de tempo de uso da semaglutida?
Isso deve ficar a critério do especialista que recomenda o tratamento, mas, pela droga em si, não. Este também é um benefício importante quando falamos de doenças crônicas, como obesidade e diabetes, já que não há restrição de tempo de uso da semaglutida. Antes, a gente tinha essa dificuldade de tratar doenças crônicas com remédios com tempo de uso limitado. Agora, sentimos mais segurança em conduzir o manejo da enfermidade sem essa restrição, ou seja, se for necessário e indicado clinicamente, a semaglutida pode ser uma medicação de uso crônico.
Algumas pessoas relatam que, apesar da eficiência da droga, após a suspensão do uso, o apetite voltou ao normal e ganharam peso novamente. Como garantir a manutenção do resultado a longo prazo?
Aqui estamos falando novamente da forma como a semaglutida vem sendo usada. A indicação correta, ou seja, para o tratamento de uma doença crônica como a obesidade, aliada a outras medidas – que podem envolver reeducação alimentar, rotina de exercícios físicos, acompanhamento terapêutico e, em alguns casos, intervenção cirúrgica –, é fundamental para essa manutenção. Se a pessoa decidir usar o remédio por conta própria, sem respeitar a posologia adequada e suspender seu uso quando chegar no resultado, voltando à rotina anterior, ela com certeza vai ter dificuldade em manter o peso que conquistou. Então vale relembrar: obesidade é uma doença crônica e deve ser tratada como tal – com cuidados para toda a vida.